Sexta-feira, 29 de Abril de 2011
Reforma do sistema educativo: tema incómodo mas urgente
Tornar Portugal num país mais competitivo não passa apenas pelo corte dos salários nominais, pela descida da TSU ou pela reforma da legislação laboral. Um aumento sustentado da produtividade do factor trabalho pressupõe uma reforma profunda no sector educativo. As reformas neste sector serão obrigatoriamente dolorosas e, uma vez que os seus resultados não surgirão senão ao fim de um mínimo de dez anos, torna-se improvável que qualquer partido esteja interessado em pegar no tema, ainda para mais face à comprovada força dos sindicatos do sector (sendo o expoente máximo o Prof. Mário Nogueira, um verdadeiro expert em conferências de imprensa e providências cautelares).
Os Portugueses trabalham mais horas e com o mesmo equipamento disponível e no entanto são menos produtivos! A lacuna está na pouca qualificaçãodo capital humano. Isto sucede porque o modelo educativo vigente está desenquadrado das exigências dum mercado de trabalho cada vez mais globalizado e competitivo. Inverter esta situação pressupõe uma reforma não só ao nível do ensino básico mas também do ensino secundário.
Vamos por partes. Relativamente ao ensino básico creio que o caminho passa por uma série de medidas que passo a referir:
- Tornar a Matemática, Humanidades (História, Filosofia), Português e o Inglês disciplinas obrigatórias ao longo de toda a vida escolar.
- Acabar com as 4 áreas de estudo opcionais a partir do 10º ano. Os alunos devem todos frequentar uma série de cadeiras obrigatórias (incluindo as acima referidas) e complementar com determinadas cadeiras opcionais que se enquadrem com as suas apetências e escolha de estudos futuros (geometria, desenho, economia, psicologia, biologia, programação etc..)
- Apostar na componente tecnológica do ensino. Não me refiro à bacocada dos Magalhães (bacocada devido à falta de preparação dos docentes pois a ideia é muito positiva uma vez que levou as novas tecnologias e a internet junto dos infoexcluídos) mas sim a introdução de cadeiras de informática que preparem os alunos para interagir com as ferramentas Office e Web, cada vez mais um requisito do mercado de trabalho.
- Incluir no currículo a disciplina de Cidadania Responsável.
- Unicidade dos manuais escolares e respectiva subsidiação a famílias carenciadas. No inicio de cada ano lectivo o MdE deve definir os manuais oficiais que devem ser comuns a todo o sistema.
Todas estas medidas se prendem com o conteúdo educativo. Quanto à estrutura do sistema:
- Criação (continuação) dos mega agrupamentos escolares. Não faz sentido manter-se abertas escolas com menos de 100 alunos. A alienação de imobilizado (mesmo que pouco significativa) deveria ser reinvestida na melhoria das infra-estruturas dos grandes agrupamentos (dotação de meios informáticos etc....)
- Criação das escolas técnicas para os alunos que desejem aprender uma profissão especifica findo o 9º ano de escolaridade obrigatória. Esta medida pressupõe um investimento considerável, não na criação do espaço físico, mas na reconversão das instalações. Proponho o seguimento do modelo casapiano com as suas escolas de carpintaria, mecànica, relojoaria, joalharia, metalúrgica etc.....
Quanto aos agentes do sector, as medidas que proponho são bastante mais complexas e controversas.
- Diminuir o número de professores. A verdade é que temos professores a mais pois tornou-se uma profissão de refúgio à falta de colocaçãonoutras actividades. Esta situação traduziu-se numa progressiva perda de qualidade do ensino
- Regras mais apertadas para o ingresso na carreira docente. Devem ser professores não só aqueles que demonstrem conhecimento mas também vocação e apetência.
- Especialização na carreira docente. Um professor deve ser responsável por uma só cadeira. No ensino, “multi tasking” nunca e uma boa medida.
- Criar um modelo objectivo e simples de avaliação de professores. É inenarrável como esta classe continua sem ser avaliada. Como não sou um expert na matéria não proponho nenhum modelo em concreto. Contudo, creio que a avaliação dos professores deveria estar associada aos resultados dos seus alunos em exames de àmbito nacional ( que deveriam ser implementados a cada dois anos de escolaridade ) de forma a evitar possíveis distorções.
- Reforço da autoridade dos professores e alteração do estatuto do aluno. O professor tem que ser a autoridade máxima dentro de uma sala de aula. Devem ser criadas regras que punam severamente a insubordinação e o absentismo, inclusive a expulsão do sistema educativo.
- Encarecer o ensino. As propinas deverão ser aumentadas significativamente. Famílias carenciadas beneficiariam de descontos e isenções. As escolas devem ser auto-suficientes financeiramente e geridas de forma profissional embora sem o objectivo de criar lucro. (entendo a complexidade desta medida para escolas em meios desfavorecidos mas creio que os benefícios o justificam)
Como o post já vai longo deixo para mais tarde propostas para o ensino secundário.
Terça-feira, 26 de Abril de 2011
Impactos macroeconómicos de um hipotético pacote de medidas
Caríssimos,
Seguindo a discussão iniciada num post por Afonso Eça, em Cenário Macroeconómico - Parte I, e dando continuidade aos respectivos comentários feitos, fica aqui a minha opinião (o post é demasiado grande para caber nos caracteres destinados aos comentários).
Sem desrespeito pela opinião alheia (até porque o autor tem toda a minha consideração e admiração), na minha perspectiva este cenário tem alguns pressupostos errados e consequentemente tem uma conclusão pouco segura. Um corte imediato nos salários nominais cria esse tal efeito de aumento da produtividade que é necessário para asegurar no curto-prazo (e no longo) a competitividade da economia e a solvabilidade do Estado (via crescimento, g, da equação, Default Grego?). Mas como está desenhado no post, parece ser um antídoto tão poderoso que” matará o doente”. Tem a limitação de ser ceteris paribus, ou seja, não contempla medidas adicionias nem estabilizadores automáticos. Permitam-me flexibilizar o modelo e introduzir medidas concretas para expor o meu cenário e tentar alterar a percepção que é criada com o (correcto, embora desconsiderando outros efeitos) racíocinio económico aplicável à realidade Portuguesa do Afonso Eça:
- 1ª medida: corte do 14º mês, o subsídio de Natal
- 2ª medida: corte adicional de mais 5% nos salários dos trabalhadores da função pública que recebam mais de 1500€ (desenganem-se que os directores não fogem para lado nenhum pois não têm para onde ir)
- 3ª medida: aumento do imposto sobre o consumo (IVA) em 2%
- 4ª medida: incentivo ao consumo de produtos internos (já existe propaganda neste sentido)
(1) C (Consumo) sofre uma enorme retracção.
- 1ª medida: Assumindo que a propensão ao gasto com consumo deste subsídio é de 75% temos que a contração do C se situa nos -5.36% (1/14*75%)
- 2ª medida: Visto que esta medida já foi uma vez aplicada, assumo que o impacto no consumo seja indêntico às existentes projecções do BdP, ou seja, uma correcção de -1.9% (fonte: previsões do BdP)
- 3ª: Não tenho previsão exacta, mas usando os mesmos multiplicadores o impacto é de -1.5% no consumo privado (2%*75%)
Usando o multiplicador do Consumo no PIB do BdP (66.6%) a retracção do Y (PIB nominal) por via do consumo é de -5.83% (um total de cortes avaliado em 8.76% vezes o multiplicador). Este valor deflacionado para o HICP projectado pela mesma entidade (3.6%) traduz-se numa perda real de -5.63% para a economia.
(2) G (Investimento Público) - o Estado tem de cortar despesa, logo diminuí o investimento público mas por ourta via com os cortes nos salários de 17.14% (5% já implementados mais a medida adicional de 5% e ainda o 14º salário 7.14%) consegue reduzir a despesa em 1.53% do PIB (segundo o INE os gastos com os salários na administração pública são de 8.93% do PIB, em 2008, logo um corte de 17.14% dará uma poupança líquida de 1.53%). Depois assumo que há um corte de líquido 5% nas despesas do Estado, já contemplando o efeito do aumento da carga fiscal (IVA). Saldo final -3.47%. Deflacionado e com efeito do multiplicador a contracção é de -0.71% no PIB real.
(3) I (Investimento Privado) – estou consensual quanto aos efeitos explicados nesta rubrica. Aproveito para acrescentar que “a redução dos custos de produção podem criar novas oportunidades de investimento no território nacional”. Aqui assumo o mesmo valor que o BdP: -5.6%. Deflacionado e com efeito do multiplicador a contracção é de -1.05% no PIB real.
(4) X (Exportações) – “dado a diminuição dos salários reais face ao resto do mundo, a nossa competitividade aumenta e portanto exportamos mais”. Sendo que 6% é a projecção do BdP sem ter em os conta cortes drásticos nos salários, penso que seja razoável falar em 10% de aumento nas exportações.
(5) M (Importações) – “apesar do consumo e outras rubricas diminuírem continuamos a ter de importar bens alimentares e energia, logo a diminuição não será drástica”. BdP assume 1.6% de cortes nas importações confirmando esta teoria. Com a campanha de sensibilização que visa esclarecer que códigos de barras são referentes a produtos Portugueses e o quão importante é para a Nossa economia o consumo dos mesmos, diria que uma redução de 2% é aceitável.
Contas finais: a contracção do PIB real em 2011 seria de 4.55% usando os inputs que aqui argumentei. O que fica aquém da não só da Grécia (-6.6% anualizando crescimento do 4º trimestre de 2010) como da Irlanda (que em 2008 sofreu um recessão que equivaleu a 10% do PIB). Este valor não me parece de todo drástico dadas as actuais circunstâncias e tendo em conta que é um medida com efeitos práticos imediatos para além de duradouros e que pode criar sinergias muito positivas na economia, numa segunda fase (explicar-me-ei quanto oportuno).
A tabela abaixo refere os números finais referentes ao PIB Português em 2010 na primeira coluna, as projecções do BdP para 2011 e finalmente o meu cenário nas outras colunas.
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BdP |
BdP Projecção |
GSR Projecção |
|
|
Pesos |
2010 |
2011 |
2011 |
|
Y |
100% |
1,48% |
-1,77% |
-4,55% |
↓ |
C |
66,60% |
2% |
-1,9% |
-8,76% |
↓ |
G |
21,30% |
3,20% |
-6,6% |
-3,47% |
↑ |
I |
19,50% |
-4,80% |
-5,6% |
-5,6% |
BdP |
Domestic Demand |
107,60% |
0,86% |
-3,7% |
-7,5% |
↓ |
Exports (X) |
28% |
8,70% |
6% |
10% |
↑ |
Imports (M) |
35,60% |
5,30% |
-1,6% |
-2% |
↓ |
|
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Contribution to GDP growth |
|
|
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Net exports |
|
0,55% |
2,25% |
3,51% |
↑ |
Domestic demand |
|
0,93% |
-4,0% |
-8,07% |
↓ |
Changes in inventories |
|
-0,20% |
-0,10% |
-0,10% |
BdP |
HICP |
|
1,40% |
3,60% |
3,60% |
BdP |
(Erros de arredondamento estão na base de discrepâncias de valores que a entidade disponibiliza e que tento replicar).
Gostaria de realçar mais um aspecto importante, nomeadamente a melhoria substancial da balança comercial que está implicita neste cenário.
A minha ideia subjacente é que um corte de salários, mesmo que muito acentuado, não é um “remédio” excessivamente forte para este doente. Aliás cortes similares foram efectuados na Irlanda (15%). Atentem por favor que não sou defensor duma austeridade desmedida com único objectivo de alcançar correcções macroeconómicas de curto-prazo. Todo este plano está inserido num pensamento que por ser extenso, exige outros posts de forma a ser completo e razoável. Pretendo provar que este ajustamento tão necessário pode efectivamente realizar-se sem pôr em causa a saúde económica de Portugal. Ao invés, num futuro próximo torna-a mais robusta.
Comentários indispensáveis: não sou isento das repercursões que vão ter tais medidas. Fique patente que quero o melhor para o meu País, se me dessem a escolher não hesitaria em enveredar por outra via. Acontece que é apenas esta (aliada com várias outras políticas estruturais já aqui referidas) que vejo a ter efeitos práticos no sentido de pôr as nossas contas públicas em ordem e criar um futuro virado para o crescimento. Em que o caminho a seguir é a produtividade e a inovação, através do investimento privado. E onde o Estado que tem como funções o mero apoio à economia ao invés de ser o motor da economia como actualmente. É patente que a entidade "Estado" é mal gerida (falta de visão estrégica que aponto no meu comentário ao post Portugal’s Unnecessary Bailout - Uma Nota), logo porque haveremos de confiar nela para gerir o nosso futuro competentemente? Desculpas pelo liberalismo desmesurado “à lá América” mas o que me ensinaram nas primeiras aulas de Introdução À Macroeconomia é que o Estado é ineficiente e que o mercado privado bem regulado (não excessivamente) é mais eficiente e capaz de gerar riqueza. Crescimento.
p.s. Peço desculpas pelo excesso de detalhes técnicos e pormenores não evidentes a quem não tenha contacto com o tema. Prometo que nos próximos posts será diferente
Evidências!
Tomo a liberdade de reproduzir neste blog uma notícia publicada hoje na versão online do Jornal de Negócios:
"Ratings e taxas de juro da dívida pública estão relacionadas
"A investigação hoje apresentada foi realizada pelo professor do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG) e funcionário do Banco Central Europeu(BCE) António Afonso, Davide Furceri da OCDE e Universidade de Palermo, e Pedro Gomes, da Universidade Carlos III de Madrid, e analisa dados diários daquelas três principais agências de “rating” entre Janeiro de 1995 e Outubro de 2010.
"Há uma causalidade bi-direcional entre 'ratings' (avaliação financeira) e 'spreads' (diferencial face à dívida alemã). É mais relevante existirem 'downgrades' (descida na notação) se existirem acontecimentos negativos, ao contrário do que sucede se houver um acontecimento positivo", disse António Afonso, que foi o orador na apresentação do trabalho.
De acordo com o estudo, acrescentou António Afonso, “parece ainda haver algum efeito de contágio entre os países cujo 'rating' aumenta e aqueles que têm um 'spread' semelhante”.
De acordo com o economista e presidente do ISEG, João Duque, que comentou o estudo, trata-se de um efeito de ligação que mostra que enquanto uns países sofrem aumentos de “ratings”, outros países, mais ou menos próximos, vão sofrer também.
Além disso, João Duque frisou que os “outlooks” (perspectivas) antecipam o “rating”: "Quando as agências informam os seus ‘outlooks’, já o mercado reagiu e até agressivamente nos mercados dos CDS (seguros contra o incumprimento da dívida) e depois do anúncio da alteração do 'rating' o mercado reforça o que a agência acabou de notar". "
Alguém acaba de descobrir a pólvora! Não foram precisos estudos para que os portugueses minimamente esclarecidos chegassem à mesma conclusão!
Um estudo que ficará para a história!
Segunda-feira, 25 de Abril de 2011
Consensos
A campanha eleitoral para as eleições de 5 de Junho será inevitavelmente condicionada pelo pacote de medidas imposto pela Troika. Sendo assim, o próximo governo terá pouca margem de manobra uma vez que o guião governativo está neste momento a ser preparado pelos enviados do BCE/CE/FMI. Contudo, os dois principais partidos têm como obrigação para com o país chegarem a um entendimento pré-eleitoral de forma a incluir no pacote de ajuda medidas e reformas estruturais que promovam o crescimento económico de forma a evitar a entrada numa espiral negativa de austeridade e recessão à semelhança do que se passa com a Grécia.
Não pode haver crescimento económico sem investimento, logo sem despesa. Neste sentido, os dois grandes partidos deveriam por de parte as quezílias e conflitos pessoais e ideológicos - que vêm enchendo os jornais e proporcionando tema de conversa para inúmeros espaços de comentário político (curiosamente o único sector imune à crise) - e desenvolver em conjunto um programa de crescimento de longo prazo, credível e ambicioso. Este é o momento exacto para encarar de frente reformas profundas em sectores chave como a justiça, educação, saúde, defesa ou administração publica que têm mantido o status quo graças ao corporativismo guerrilheiro ou ao lobying.
PS e PSD, consenso possível ou meramente utópico...?
Feel free to discuss!!
P.S: Medidas concretas para uma reforma de fundo num post a publicar brevemente
Quinta-feira, 14 de Abril de 2011
O Crepúsculo da Democracia
“No céu cinzento sob o astro mudo
Batendo as asas pela noite calada
Vêm em bandos com pés de veludo
Chupar o sangue fresco da manada
(...)
Se alguém se engana com seu ar sisudo
E lhes franqueia as portas à chegada
Eles comem tudo,
Eles comem tudo,
Eles comem tudo e nao deixam nada”
Zeca Afonso, “Vampiros”
No passado dia 11 de Abril, desembarcou na Portela uma trintena (33 hoje…) de indivíduos de ar cinzento e enfadado. Noutra qualquer altura, este seria um acontecimento banal: um grupo de veraneantes do Centro / Norte da Europa numa curta deslocação a Portugal onde iriam disfrutar de um clima ameno e cerveja barata. Contudo, esta chegada nada teve de banal e muito menos de inocente pois tratava-se da delegação enviada pela “Troika” para governar Portugal nos próximos tempos.
Qualquer Português com um mínimo de orgulho patriótico não pode deixar de se sentir profundamente envergonhado e humilhado com este acontecimento. O povo “já não é quem mais ordena”. As conquistas de Abril foram chutadas para canto. Nos próximos tempos a “democracia será suspensa” – mas por muito mais de 6 meses, Dra. Manuela – e viveremos sob as ordens de Bruxelas e Berlim.
Todos sabìamos que nos próximos anos terão de ser feitos grandes sacrifícios e que o empobrecimento geral será inevitável. Contudo, ainda tinhamos uma escolha: fazê-lo pelo nosso próprio pulso (ainda que condicionado) mantendo a nossa dignidade e soberania intactas ou fazê-lo a mando de outros que vêm números mas ignoram rostos, tornando Portugal alvo de chacota pelo mundo fora. A gota de água que nos atirou definitivamente para o anedotário duma Europa, também ela cheia de problemas, foi a rejeição do PEC laboriosamente negociado por um Governo legítimo com o BCE e a UE e por estas instituições aplaudido e a consequente demissão do Governo por uma coligação puramente destrutiva e agente da vingança do Presidente da República.
Este desfecho era inevitavel? Obviamente que não! Portugal conta com profissionais brilhantes que dão cartas tanto entre portas como nos mercados mais competitivos do mundo: New York, Londres, Frankfurt... Será que esta troupe recem chegada conhece alguma poção magica? Não poderiamos nós próprios chegar às mesmas, e quiçá até melhores, soluções. Claro que podiamos! Não fomos capazes, por raivinhas e caprichos de formar uma selecção nacional de ataque à crise. E agora ficamos entregues a uma equipa de terceira divisão. Bonito serviço.
Para terminar, apenas uma observação. Os quadros do BCE, Comissão Europeia ou FMI, que vão decidir o nosso destino, estão longe de ser indivíduos brilhantes. Eles são “segundas escolhas” nos seus paises. Ao contrário do que se passa em Portugal, em que os melhores lideram empresas Portuguesas de referência internacional nos seus sectores e outros ocupam cargos em empresas e instituições internacionais atraídos por melhores salários e condições de trabalho, na Alemanha, Inglaterra, França... passa-se o inverso. Nesses países, ingressam nas fileiras dos organismos europeus aqueles que não entraram, ou não vingaram no Deutschbank, no Lloyds, na SocGen ou mesmo na Administração Pública dos seus Países.
A Dra. Ferreira Leite teve uma triste e sombria premonição: isto só lá ia com seis meses de suspensão da democracia. Enganou-se: vão ser seis anos. As grandes conquistas do nosso tempo – a democracia política e a economia de mercado – vão ser congeladas e o País vai ser entregue ao pior inimigo de uma e outra: a burocracia.
Abdicamos da nossa soberania, da nossa dignidade, do nosso orgulho para sermos governados por uma equipa de reservas europeia. Triste fado...
Terça-feira, 12 de Abril de 2011
Desmistificando a ajuda Alemã
George Soros, bilionário e filantropo húngaro, numa entrevista recente ao Financial Times, desmistifica a posição alemã na ajuda aos países em dificuldades e aponta soluções para a coesão futura da Zona Euro.
Nao podia estar mais de acordo com as suas previsões! Vamos por partes.
A Alemanha culpa os países periféricos pela crise, dada a sua progressiva perda de competitividade e os níveis elevados de endividamento, pelo que lhes atribui todo o ónus de ajustamento. Segundo Soros, esta é uma perspectiva inquinada, dado que não se trata apenas de uma crise de dívida soberana mas também uma crise bancária e monetária, tendo a Alemanha uma elevada quota de responsabilidade. Aquando da introdução da moeda única, o BCE encarou a dívida soberana de todos os países membros como “risk free” e aceitou-a na sua janela de desconto em condições iguais. Os bancos, forçados a deter no balanço activos “risk free” para cumprir requisitos de liquidez foram acumulando dívida soberana de países mais frágeis de forma a ganharem uns pontos base extra. Esta medida levou à descida das taxas de juro em países como Portugal, Espanha, Grècia, Irlanda e Itália. O resultado foi uma divergência em termos de competitividade e uma crise bancária na qual os bancos germânicos foram os mais afectados. Neste contexto, a ajuda alemã aos países em dificuldades não é simplesmente altruísta nem o reflexo da solidariedade europeia, mas sim uma forma de proteger o seu sistema bancário.
Diagnosticada a origem do problema, Soros aponta duas soluções, a meu ver, acertadas. A primeira passa pelo resgate do FEEF não só dos países em dificuldades mas também dos respectivos sistemas bancários. O tamanho do pacote de ajuda seria quase igual uma vez que qualquer quantia utilizada na recapitalização ou liquidação de bancos reduziria a quantia emprestada aos estados.
A segunda solução passa pela eliminação do “risk premium” nos custos de financiamento dos países que cumpram as regras da UE (déficit menor ou igual a 3% e endividamento inferior a 60% do PIB). Esta solução, implicaria a conversão da dívida soberana em eurobonds; os países emitiram dívida com collective action clauses (CAC – cláusula de acçao colectiva: permite a uma maioria dos bondholders votar a favor de uma reestruturação da dívida) e pagariam um “risk premium” consonante com algum desvio aos critérios de Maastricht.
Recorde-se que George Soros ficou conhecido como “The man who broke the Bank of England” após ter especulado sobre a depreciaçao da libra em 1992.
Sexta-feira, 8 de Abril de 2011
Os Comediantes
Que Portugal vai ter um futuro problemático pela frente já todos nós sabemos. Só não sabemos como é que isto vai acabar: Se como um membro de pleno Direito da Europa; Se como uma província pobre e assistida da Europa rica: um campo de férias e de repouso para os reformados fugirem ao rigor dos prolongados invernos do centro/norte da Europa.
Entretanto, quando ao fundo do túnel não se vislumbram ainda sequer as luzes dos pirilampos, já temos por adquirido o empobrecimento progressivo; os cortes salariais mais ou menos acentuados e a eliminação da constelação de mordomias que cada classe profissional foi tecendo imperceptivelmente, sob o olhar distraído ou complacente de tutti quanti.
Mas nem tudo são tristezas no nosso fadário. Dia após dia irrompem no nosso quotidiano acontecimentos e personagens que aliviam a carga dramática e injectam um pouco de humor nas nossas vidas tristonhas:
· O nome da filha da Luciana Abreu tornou-se um caso nacional a somar à história torturada dos amores donde nasceu o rebento;
· O sarau de poesia em Belém com a D. Maria de Cavaco Silva a declamar os seus poemas inéditos, deixou Portugal inteiro suspenso de curiosidade de os conhecer;
· O ingresso da Manuela Moura Guedes na SIC seguramente para reforçar a qualidade da informação, fazer crescer as audiências e o valor do título que já está abaixo da gorgeta devida para a reintegração social dos arrumadores do Rui Rio.
· O episodio do Paulo Futre com o departamento do jogador chinês e os charters dos indígenas do Império do Meio inundando tudo o que é casas de comes e bebes de Lisboa com a prodigalidade das suas comissões e gorgetas…
· Os corninhos de Manuel Pinho apontados ao deputado Bernardino Soares, apesar de antigo, ainda não caducou e continua a fazer parte do património dos inusitados momentos de pura comédia da legislatura cessante.
O mais recente comediante do burgo dá pelo nome de Marco António Costa, Vice-Presidente do PSD e Administrador do Metro do Porto. Há dois dias atrás, reiterando o compromisso do PSD em manter as SCUTs caso venha a formar governo, saiu-se com esta pérola: “o discurso do Primeiro-Ministro denota a preparação da opinião pública para mais medidas de austeridade”.
Só pode ser para rir! O PSD chumba o PEC IV, precipita a queda do Governo e o pedido de ajuda que trará consigo medidas muito mais duras que o programa chumbado e este senhor tem esta tirada !!! Verdade seja que o Dr. Durão Barroso estava atento em Bruxelas e já se apressou a confirmar as previsões arrojadas do Dr. Marco António, um dos valores mais seguros e promissores do novo PSD.
Como nota final, há que referir que durante o seu mandato como Administrador do Metro do Porto a escalada dos custos operacionais e do endividamento deixou a empresa numa situação em que não garante os salários dos trabalhadores pois não se consegue financiar nem pagar os compromissos assumidos com a banca. Entretanto o Presidente da Metro do Porto, Ricardo Fonseca adiantou não se recandidatar e afirmou que o modelo de financiamento foi inadequado ao perfil e nível de investimentos ....
A mesma Administração da Metro do Porto, a fazer fé nas palavras do ministro António Mendonça, propôs recentemente um investimento de 2,5 mil milhões de euros para expansão da rede...
Para animar os mais descrentes nas virtudes da democracia finalizamos com os edificantes episódios do último Conselho de Estado.
Com o sorriso beatífico dos que se sentem tocados pela graça divina, o Dr. Bagão Félix veio assegurar que o Primeiro Ministro ou estava mouco ou distraído na última reunião duma instituição que é a créme de la créme das instituições que tem a seu cargo os nosso destinos: o Conselho de Estado.
E se não é mouco nem distraído só pode ser mentiroso, ou possivelmente as 3 coisas, que nisto de assassinatos de carácter convém não deixar nenhuma hipótese em aberto.
O Dr. Capucho vem assegurar que o Dr. Bagão tem razão, mas o Dr. Carlos César e o Dr. Almeida Santos garantem que ambos estão equivocados.
Sobre esta balbúrdia do Conselho de Estado paira a divisa imortal do poeta: “Ditosa Pátria que tais filhos teve”
Nós por cá, todos bem, entregues como estamos a estes Pais e Filhos da Pátria.
Quinta-feira, 7 de Abril de 2011
Portugal à procura dum Presidente
Tudo começou com o discurso de investidura do Presidente da Républica.
De um candidato eleito por menos de 1/3 dos eleitores esperava-se um discurso inteligente e generoso, lançando pontes de entendimento para os que tão maciçamente tinham virado costas ao jogo, abstendo-se, e para os que tinham feito outras opções, muito mais de 2/3 se lhes juntarmos os votos em branco injustamente descontados aos votos válidamente expressos. Confirmando as piores expectativas geradas pelo inenarrável discurso de vitória, o Presidente persistiu no tom ameaçador e vago que tinha designado de magistratura activa. A generalidade dos escribas gostou do discurso: para um país tresmalhado e pobre, o Presidente garantia ordem e progresso sem esquecer uma atenção sacramental e retórica para os mais desfavorecidos e mais tocados pela crise.
No dia maior da celebração da democracia o Presidente dividiu o país e os seus representantes. Foi um discurso sem alma e sem grandeza e sobretudo sem o desígnio mobilizador para um país cada vez mais desorientado com as cenas de impotência e de combate entre as instituições de quem se esperava concórdia e acção.
No que à vida partidária diz respeito, o discurso do Presidente deixou claro que o Governo estava a mais e ninguém duvidou a partir daí que mais cedo do que mais tarde ia ser apeado. Com a necessária humilhação para vingar a campanha negra que tinha ousado duvidar da honestidade do homem duas vezes mais sério do que qualquer português.
Despachado o governo, quis o Presidente aprisionar também a oposição, particularmente o putativo partido alternante, o PSD. No vulcão permanente que tem sido a vida do PSD, a ânsia de aceder ao poder tornou-se imparável e os assomos de homem de Estado que o Dr. Passos Coelho vinha ensaiando foram impotentes para travar o “eleições já” que o partido exigia. Confirmava-se assim que o líder do PSD estava definitivamente agrilhoado à estratégia de Belém: primeiro o inefável Dr. Catroga ofereceu-lhe, chave na mão, o acordo do orçamento; agora prepara-se para lhe outorgar um programa de governo para os próximos oito anos.
Acossado pelo radicalismo natural do seu partido, exacerbado agora pelo discurso incendiário do Presidente, o Dr. Passos Coelho deparou-se com a alternativa: ou abria a crise no PSD com a consequente e habitual defenestração do líder; ou criava uma crise política no país derrubando o governo. A aliança original e espúria com o PCP e o BE deve ter-lhe dado voltas ao estômago, mas os supremos interesses do partido e do Supremo Líder lançaram-no à aventura e a atirar o país para o abismo de uma crise sem precedentes conhecidos por qualquer português vivo. E assim chegámos onde estamos: sem política, sem governo, sem oposição e sem Presidente, que aos costumes disse nada, dizendo que nada disto era com ele. Mas se soubermos ler os sinais em que o Presidente se especializou não valerá a pena dramatizar: é que como abundantemente reportaram em tons e cores suaves as revistas do coração, na semana passada ou talvez antes, enquanto o país ardia e os responsáveis da banca e das empresas arrancavam os cabelos, em Belém celebrava-se o dia da poesia com um sarau que faria inveja à defunta Marquesa de Alorna. O país anda à procura de um Presidente? Não desesperem. Ele virá, envolto em neblina que nem El Rey Don Sebastião, no momento em que todos pensarem que já não faz cá falta!
Quarta-feira, 6 de Abril de 2011
Conversas Entre Nós: Day One
Portugal enfrenta uma crise económica sem precedentes. Todos os dias os meios de comunicação social debitam noticias e expressões que até há bem pouco tempo eram totalmente desconhecidas para a maioria dos portugueses: rating, solvabilidade, FMI… Stress Test… Dizia-se dantes que de médico, poeta e louco todos temos um pouco. Agora, de economistas encartados também.
Chegámos a um ponto em que o empobrecimento nos próximos anos já será inevitável…
Contudo, mais preocupante que a crise económica é a falta de perspectivas de crescimento e, sobretudo, a falta de dignidade e sentido patriótico da classe política vigente. Seja esquerda ou direita, liberais ou conservadores, moderados ou radicais nao existe na classe politica de hoje nenhuma figura que transmita confiança e que tenha capacidade de mobilizar e conduzir o país pelo caminho sinuoso e difícil que tem que atravessar até voltar a uma situação de estabilidade financeira que lhe permita, novamente, traçar sozinho o rumo do seu destino.
Face a uma situação de afastamento da vida politica dos jovens (e da população em geral!!), por culpa da comprovada mesquinhez e inépcia dos políticos que hoje governam o nosso país, decidi criar este blog. Criei este blog, porque ao contrário de muitos não me rendo ao conformismo e pessimismo crónicos, não vejo sempre o copo meio vazio, não fico a espera que me apontem o caminho... Tenho ideias, tenho convicções que quero partilhar...
Este blog servirá como um espaço de troca de ideias e de reflexão politica e económica apartidário e descomprometido. As opiniões aqui expressas serão sempre pessoais e subjectivas, sem pretensões de agradar nem medo de ofender.